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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2004 Harlequin Books S.A.

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

UM HOMEM E UM BEBÉ, nº 54 - Janeiro 2014

Título original: The Homecoming

Publicada originalmente por Silhouette® Books

Publicado em português em 2008

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin ouro e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5055-2

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

 

 

Faz parte de

 

O LEGADO DOS LOGAN

 

Porque o direito à nascença tem privilégios e os laços de família são muito fortes.

 

Refugiado na sua ilha, um homem perdido encontra uma mulher que afirma conhecer o seu filho raptado. Será que a redenção e o amor os comoverá?

 

SYDNEY ASTON: a história do seu filho adoptado era misteriosa, portanto foi à procura da família biológica do bebé. Quando conheceu Danny Crosby, apaixonou-se por ele e teve de lutar com o seu coração. Ele tinha de conhecer a verdade: o seu filho amado continuava com vida!

 

DANNY CROSBY: depois do desaparecimento do seu filho, ficou devastado e afastou-se para ter a vida de um ermitão. No entanto, Sydney fê-lo voltar para a vida... e devolveu-lhe o filho pelo qual estivera a sofrer durante todos aqueles anos. Será que ele se arriscaria a constituir uma família pela segunda vez?

 

O reencontro dos Logan: os Logan visitam o seu filho, que pensavam que estava perdido, e juram ajudar o menino doce que lhes arrebataram há muitos anos. Finalmente, Robbie Logan voltou para casa.

Um

 

O sonho começou como sempre. O melhor amigo de Danny ia-se embora com o homem estranho.

Danny tinha medo. A sua professora, a menina Hanley, dizia-lhes sempre que não deviam seguir nenhum estranho, que não deviam entrar em carros de desconhecidos. Dizia-lhes que se só aprendessem uma coisa no primeiro ano, era aquela que deviam aprender.

Até a mãe de Danny, que não se preocupava muito com o que ele fazia desde que não a incomodasse, o obrigara a prometer que nunca iria a lado nenhum com outra pessoa que não fosse o seu pai, ou ela, sem a sua permissão.

Danny entrou a correr em casa, chamando a sua mãe. Ela podia parar Robbie. Se ele conseguisse encontrar a sua mãe, ela podia salvar o seu amigo.

Mas a sua mãe não estava na cozinha, nem na sala, nem em lado nenhum. Ele chamava-a, mas ela não respondia.

No seu sonho, ele saía a correr freneticamente. Ali! Uma senhora! Uma das vizinhas estava a passear pela rua. Danny aproximava-se rapidamente, a chorar.

— Por favor, ajude-me! — gritava. — Um homem mau está a levar o meu amigo!

Mas a senhora nem sequer olhava para ele e, de repente, ele percebia que não era a sua vizinha. Não era ninguém que ele conhecesse e não olhava para ele nem lhe dirigia a palavra.

Aproximava-se outro homem e Danny pedia-lhe ajuda, mas o homem afastava-se como se não o tivesse ouvido. Danny repetia as suas acções com todas as pessoas que via, cada vez mais frenético, porque todos passavam sem olhar para ele. Ouvia-se a soluçar.

— Por favor... ajudem-me, ajudem o meu amigo...

Então, ouvia uma voz atrás dele.

— Eu ajudo-te. Vem comigo.

Danny virava-se, aliviado. No entanto, quando via a cara do homem que estava em frente dele, com as mãos estendidas, o pânico dissipava todo o seu alívio.

O homem mau estava junto dele. Danny estava demasiado aterrorizado para se mexer. A única coisa que fazia era ver como o homem o agarrava...

 

 

Danny Crosby acordou a gritar e sentou-se na cama. Com aqueles gritos, os seus criados perguntar-se-iam o que estava a acontecer no seu quarto às seis da manhã. Passou as mãos pela cara e pelo cabelo.

Meu Deus, o pesadelo fora pior do que o normal, tão vívido como quando ele era mais jovem.

Com o coração acelerado, acalorado e suado, Danny sentiu-se incapaz de continuar na cama. Sabia que não fazia sentido tentar voltar a adormecer.

Afastou os lençóis, levantou-se e caminhou nu até às portas do terraço do seu quarto. Estava na ilha da qual era proprietário, Nanilani, a menos de dois quilómetros da costa sul da ilha de Kauai. Ali não havia ninguém que pudesse vê-lo. Era uma noite clara e agradável de princípios de Julho no Havai, embora ele mal percebesse. A beleza do lugar onde decidira passar o resto dos seus dias estava toldada pelas lembranças horríveis que não conseguia superar.

Por um reflexo, deu umas palmadinhas no peito à procura de um cigarro, todavia, apercebeu-se de que não estava vestido. E ainda mais importante era o facto de ter deixado de fumar quando entrara na reabilitação, há uma década. Mesmo depois de Noah e Felicia... Interrompeu aquele pensamento. Havia um limite nas torturas que podia suportar durante uma só noite.

Respirou fundo e tentou relaxar, observando o ritmo hipnótico das ondas que via do terraço.

Para além da colina de rochas vulcânicas que separavam as dunas da beira-mar, as ondas batiam contra a margem e transformavam-se em espuma branca. A areia da praia era mais clara do que as rochas. As praias de areia preta eram mais comuns nas ilhas da parte leste do arquipélago. Lá, as ilhas eram ainda jovens e continuavam a crescer devido à actividade vulcânica.

Em Nanilani, como no resto da parte noroeste, o crescimento das ilhas acabara há milhões de anos.

Aquela ilha não era exactamente dele. Brian Summers, o agente imobiliário de Portland que tratara da compra do terreno, fora muito claro naquele detalhe. Todas as praias do Havai eram propriedade do Estado, mas Danny era o proprietário do resto do terreno, portanto não havia acesso à ilha, excepto por mar. E, como as praias de Nanilani não eram das mais seguras nem das mais belas comparadas com outras mais famosas do Estado, ele raramente tinha de se preocupar com o facto de os barcos dos excursionistas pararem lá demasiado tempo.

É claro, a beleza era um termo relativo no Havai, onde qualquer lugar tinha vistas espectaculares. Até o nome da ilha se referia a isso: «nani» significava «belo» em havaiano e «lani» significava «céu». Nanilani: céu belo. Danny duvidava de que pudesse haver algum canto feio naquelas ilhas.

Tivera muita sorte há três anos, quando pedira a Brian para lhe encontrar um lugar isolado para viver no arquipélago. A família Robinson, proprietária de Ni’ihau e de parte do Kauai, queria vender Nanilani.

De repente, Danny percebeu o que pensara: tivera sorte? O sequestro de um filho e o suicídio da sua esposa não era o tipo de sorte que desejaria. Rapidamente, afastou aquilo da sua cabeça e continuou a pensar na vista que tinha à frente dele. Quantas vezes estivera lá em baixo, na praia, pensando em caminhar para dentro do mar até as ondas o terem engolido?

Muitas. Mas já percorrera o caminho da destruição própria no passado e não voltaria a fazê-lo. Trent ficaria destruído. E Danny preferia cortar um braço a magoar o seu irmão mais velho, que o tirara do inferno quatro vezes: ajudara-o a sair daquela odiosa academia militar; convencera o seu pai, Jack, a procurá-lo quando ele desaparecera; pusera-o na reabilitação depois de ter estado prestes a morrer de overdose e obrigara-o a trabalhar na empresa familiar depois de perder Noah e Felicia. Aquilo talvez não parecesse a actuação de um salvador, mas fora: o seu irmão conseguira dar a Danny um propósito que o mantivera são durante os dias mais escuros da sua vida. Então, jurara que nunca mais falharia a Trent e não o faria. Nem no negócio, nem de nenhum outro modo.

«Bolas, Dan, estás a pensar novamente».

Não estava a ter muito sucesso com a sua meditação naquele dia.

À sua esquerda, a praia desaparecia no horizonte. Ele sabia por experiência que aquela faixa de areia se prolongava durante quilómetros antes de morrer contra uma falésia de rocha. À sua direita, não tão longe, outra falésia semelhante interrompia a praia bruscamente. A base da falésia estava salpicada de rochas enormes que tinham caído ao mar devido aos terramotos que tinham sacudido a ilha há milhões de anos.

Por baixo dele, havia mais rochas que saíam do mar, enganadoramente pequenas vistas dali. No entanto, ele conhecia-as e sabia que muitas delas eram muito mais altas do que ele.

As ondas batiam contra a parte de baixo da falésia e ultrapassavam as rochas, seguindo o seu caminho para a praia. Algo chamou a sua atenção e franziu o sobrolho, tentando focar a vista com mais precisão. Sobre uma das rochas mais pequenas havia uma cor clara, algo que estava deslocado. Ele conhecia perfeitamente aquela vista, observara-a dia após dia durante três anos. Fosse o que fosse, não fazia parte da paisagem natural.

Observou a forma de cor clara com espanto. Não houvera nenhuma tempestade ultimamente que tivesse podido atirar alguma coisa para fora do alcance da água.

Então, Danny percebeu o que era. Aquela silhueta era de uma pessoa!

Nem sequer o assimilara por completo quando entrou no seu quarto, pegou nas calças de ganga e as vestiu rapidamente. Depois, saiu da casa e desceu a correr os degraus de pedra que conduziam ao caminho de descida da falésia para a praia.

De onde saíra aquela pessoa? A figura não se mexia. Danny ia a rezar a Deus para que não tivesse morrido. Morria muito mais gente afogada por ano naquele Estado do que em qualquer outro. E, mesmo que não se tivesse afogado, podia sofrer de hipotermia se tivesse estado durante muito tempo na água. As águas do Havai eram quentes, mas um banho prolongado no Pacífico quando o sol ainda não nascera não podia ser uma experiência agradável. E supunha que fora isso que acontecera àquela pessoa, porque Danny não via nenhum tipo de embarcação por perto.

Enquanto descia, via as luzes de Kauai, a ilha situada mais a norte do arquipélago principal do Havai, e as da sua ilha vizinha, brilhantes no horizonte. Será que aquela pessoa navegara até ali e se perdera?

Quando chegou ao fundo das escadas, começou a correr pela areia, suave e seca, até chegar à superfície mais plana e compacta da margem. Então, seguiu um ritmo rápido e constante, como nas suas corridas matinais diárias.

Enquanto corria, a sua mente continuava a funcionar. Ocorreu-lhe que fora uma tolice sair a correr da casa sem um dos transmissores portáteis que comprara para comunicar com as outras duas pessoas que viviam com ele na ilha. Era um casal havaiano mais velho, que trabalhara para o proprietário anterior e que realizava um trabalho excelente para Danny. Tinham uma grande família de filhos e netos que visitavam a ilha em barcos a motor várias vezes por semana, com o correio, a comida e tudo o que era necessário. De vez em quando, alguns deles ficavam alguns dias com os seus pais, mas a maior parte do tempo Danny, Leilani e Johnny viviam sozinhos.

Leilani cozinhava e limpava a casa e o seu marido mantinha o jardim e os arredores em perfeito estado. As pessoas que não eram da sua família chamavam-lhe Grande John e era uma alcunha bem merecida. Era um homem grande e musculado. Se a pessoa que estava nas rochas estivesse ferida, Danny voltaria e pediria ajuda a Johnny para a levar para casa.

Danny aumentou o ritmo da corrida até chegar às primeiras rochas. Dali via claramente que a forma das rochas era, com efeito, uma pessoa. Uma pessoa que não se mexia e que, aparentemente, não mudara de posição desde que Danny a vira pela primeira vez. «Por favor, meu Deus, que não esteja morto».

Com a respiração acelerada, Danny subiu pelas rochas. A manta que pusera sob o braço em casa caiu ao chão quando chegou ao topo. O tipo era pequeno. Danny rezou para que não fosse uma criança. Quando se ajoelhou junto da pessoa, teve o mau pressentimento de que estava junto da vítima de um afogamento.

No entanto, ficou espantado ao verificar que se tratava de uma mulher. Estava deitada de barriga para baixo, com a cabeça inclinada e o cabelo castanho despenteado. Não estava encharcado, mas sim húmido. Em parte, o cabelo cobria-lhe a cara e a única coisa que ele via era a curva da sua face e um pequeno nariz recto.

Embora parecesse que estivera ali o tempo suficiente para que o excesso de água secasse nos seus calções e na sua camisa, tinha a roupa também húmida e aquilo confirmava o que Danny pensara ao princípio: devia ter chegado até ali num barco ou numa lancha de alguma outra ilha. Certamente, de Kauai, porque em Ni’ihau só havia uma pequena vila habitada por havaianos. Embora Danny não entendesse, na verdade, porque é que uma turista teria saído sozinha para navegar pelo oceano.

Tinha a certeza de que não era dali. Soube pela cor da sua pele. Não estava bronzeada e tinha a cara pálida. Não parecia que tivesse queimaduras do sol, portanto devia ter chegado àquelas rochas depois do entardecer do dia anterior.

Uma turista sozinha à noite?

Ele pousou uma das mãos sobre o seu braço e esteve prestes a fraquejar de alívio. Não estava frio como o de um cadáver e, no seu pulso delicado, Danny sentiu os sinais vitais. Não eram fortes, mas também não eram fracos.

Danny inclinou-se e aproximou a orelha da boca dela. Graças a Deus, respirava lenta e constantemente. Não parecia que estivesse em perigo de vida.

Com cuidado, ele começou a passar as mãos sobre os braços e as pernas da mulher, que era esbelta e estava em forma. Ele não tinha muita experiência em primeiros-socorros e certamente não saberia se tinha um osso partido a menos que fosse uma fractura muito evidente, mas não lhe parecia que houvesse nada fora do comum no estado daquela mulher.

Tinha uma pele muito bonita, suave e sedosa, mas um pouco fria. Ele desdobrou a manta e tapou-a. Danny sabia que, se ela tivesse um traumatismo craniano, era importante mantê-la quente.

— Eh! — exclamou ele, que não queria mexê-la. — Menina? Acorde. Fale comigo, por favor.

Danny sabia que não devia mexê-la. Parecia que estava bem, portanto o melhor que podia fazer era voltar para a casa para pedir ajuda e regressar depois. No entanto, não queria deixá-la sozinha enquanto ela estivesse inconsciente. E se acordasse e não visse ninguém ao seu lado? Podia começar a andar na direcção errada.

Se não olhasse para a casa, talvez não a visse. E se a visse, talvez nem sequer soubesse como chegar até ela. Por outro lado, se não estivesse em plenas faculdades quando acordasse, talvez nem sequer percebesse que a manta era sinal de que alguém a encontrara.

Naquele momento, ela emitiu um gemido e, instantaneamente, o som resolveu o seu dilema. Não podia deixá-la sozinha se estava prestes a recuperar os sentidos.

Ela voltou a resmungar e mexeu-se. Quando fez fracas tentativas de se endireitar, ele pôs-lhe uma mão nas costas.

— Não tentes mexer-te — avisou.

Sob a palma da mão, Danny sentiu que o seu esbelto corpo relaxava. Ele começou a mexer a mão em pequenos círculos, suavemente, como fazia com o seu filho quando ainda estava com ele.

— Não sei de onde vieste, mas não há nem rasto do teu barco, portanto há a possibilidade de teres feridas se bateste contra as rochas ao tentares chegar até à praia.

— Não acho — replicou ela lentamente, num tom de uma voz agradável e ligeiramente rouco. — Não sinto nada partido — acrescentou. Ficou em silêncio durante um instante e, depois, perguntou: — Estava num barco?

— Eu tinha a esperança de que pudesses dizer-me — respondeu ele. Então, ocorreu-lhe que talvez ela não estivesse sozinha. — Sabes se havia mais alguém contigo?

Meu Deus, seria melhor verificar se não havia ninguém ferido perto dali.

Ela ficou calada. Finalmente, disse num tom de voz muito baixo:

— Não me lembro.

Danny olhou em seu redor e não viu nenhum outro corpo nas rochas nem na praia. Então, porque é que aquela turista fora navegar sozinha? Nem sequer um nativo das ilhas teria corrido semelhante risco.

Como se lhe tivesse lido o pensamento, disse enquanto os seus dentes batiam:

— Naveguei pelo rio durante toda a minha vida, mas o mar é muito diferente.

— Sim — respondeu ele. — O oceano é muito diferente.

Danny tentou não pensar no que podia ter acontecido àquela mulher se não tivesse conseguido agarrar-se às rochas da sua ilha. Mais de uma pessoa ficara presa nas correntes fortes que iam das ilhas para o Pacífico, sem que houvesse nenhuma ilhota durante centenas de milhares de quilómetros. Outras, sem barcos, encontraram-se com os tubarões que povoavam aquelas águas.

Estava prestes a perguntar-lhe a que rio se referia quando ela tentou levantar-se novamente e, daquela vez, Danny pensou que talvez devesse deixar que tentasse. Afastou-se e ela rodou e pôs-se de costas. Depois, sentou-se, com as pernas encolhidas.

— Oh! — exclamou. — Estou enjoada.

Daquela perspectiva, ele via bem a razão daquele enjoo. Em cima da têmpora direita, a mulher tinha uma ferida feia provocada por um golpe. Ainda sangrava. Danny olhou para baixo e viu uma mancha escura de sangue sobre a rocha, onde ela estivera deitada. Sentiu um nó no estômago.

— Bateste com a cabeça — informou, tentando manter a calma. No entanto, não conseguia parar de se perguntar quanto sangue teria perdido. «Acalma-te», disse para si. «Todos sabem que as feridas na cabeça sangram muito e parecem piores do que são». — Parece que bateste nas rochas.

Provavelmente, aquela mulher era bonita, pensou, limpa e com um pouco mais de cor na cara. Tinha umas maçãs do rosto bonitas, o nariz perfeito e, embora tivesse os lábios quase azuis, eram grossos e bem formados. Ela fechara os olhos ao sentar-se, portanto ainda não conseguira ver a sua cor.

Danny percebeu que estava a engolir em seco e a respirar fundo. De certeza que estava a tentar reprimir as náuseas.

— O meu nome é Danny — apresentou-se. — Vivo nesta ilha. Imagino que vieste da ilha Kauai ontem à tarde e ficaste presa nas correntes.

— Sim. Presa nas correntes — concordou ela, num tom de voz fraco. — A corrente empurrou-me contra um recife.

— Em Kauai?

Ela hesitou e encolheu os ombros muito devagar.

— Não tenho a certeza — admitiu.

Aquilo era comum. Segundo Danny ouvira dizer, as pessoas que batiam com a cabeça esqueciam-se das coisas temporariamente. Sobretudo, as coisas que tinham acontecido antes do seu acidente.

— Como te chamas? — perguntou-lhe.

Ela levantou a cabeça cuidadosamente. Parecia estar a tentar perceber se o seu estômago resistiria àquele movimento enquanto abria a boca para responder, mas então, uma expressão estranha reflectiu-se no seu rosto.

— Eu... o meu nome é... não sei! — exclamou, espantada e confusa. — Dá-me um minuto. Estou um pouco... um pouco... não sei quem sou!

Tinha os olhos azuis, muito azuis naquele momento, já que as suas íris estavam rodeadas por uns círculos escuros.

— Está bem. Relaxa. Tenho a certeza de que o recordarás num instante — declarou ele, num tom suave e calmo. — Estaremos aqui durante um instante e, quando te sentires melhor, levo-te para minha casa.

Danny esperava que Johnny aparecesse antes de ter de a levar, porque tinha a certeza de que a sua convidada sem nome não conseguiria dar um passeio pela praia.

— Consegues olhar para os meus olhos? — perguntou-lhe, enquanto se punha em frente dela.

— Porquê? — perguntou-lhe ela, no entanto, obedeceu.

— Quero ver as tuas pupilas.

— Oh...

Pareceu-lhe que não as tinha dilatadas e agradeceu a Deus. Se tivessem tido tamanhos diferentes, ele teria sabido que estava a acontecer algo grave.

Danny viu as horas no relógio de soslaio. Faltavam vinte minutos de espera. Leilani estaria à espera dele para tomar o pequeno-almoço às sete e, se não aparecesse àquela hora, enviaria Johnny para o procurar. E como ele sempre corria pela praia antes de tomar o pequeno-almoço, a primeira coisa que Johnny faria seria descer pela falésia à procura dele. Então, Danny podia enviá-lo novamente para casa para que procurasse algo parecido com uma maca. Embora estivesse em boa forma e aquela mulher fosse magra, Danny soube que não conseguiria levá-la sozinho por toda a praia e subir pelo caminho da falésia até casa.

De repente, distraiu-se dos seus pensamentos, ao vê-la apoiar ambas as palmas no chão e preparar-se para se levantar.

— Provavelmente, não devias mexer-te — avisou ele. — Na minha casa há alguém que poderá ajudar-me a levar-te para lá dentro de alguns minutos.

— Sou demasiado grande para me levarem — indicou ela, sorrindo como se aquilo fosse engraçado. — Consigo andar — acrescentou.

E depois, antes de ele ter tempo de a impedir, levantou-se.

Danny imitou-a rapidamente e agarrou-a quando ela começou a cambalear. Durante um instante, pensou que teria desmaiado, porque ela caiu para ele e a sua cabeça caiu na curva do ombro dele.

— Oh! — exclamou ele.

— Lamento — murmurou a mulher.

— Porque não te sentas novamente? — sugeriu-lhe Danny. — Há um bom passeio pela praia até chegar às escadas que sobem pela falésia até minha casa. O meu empregado virá até aqui daqui a pouco e ajudar-nos-á.

A mulher era mais alta do que ele esperava e encaixava perfeitamente contra o seu corpo de um metro e oitenta e cinco. Felicia era de estatura mais baixa. Quando dançavam juntos, embora na verdade não dançassem muitas vezes, ele tinha cãibras no pescoço de olhar para ela.

Sentiu uma pontada de dor. Nunca imaginara que voltaria a ter outra mulher nos braços. Não quisera tê-la. A única coisa que desejava era que o deixassem em paz.

— Acho que devia sentar-me. Tenho a cabeça às voltas. Lamento muito.

— Não faz mal — replicou Danny.

Ele ajudou-a a sentar-se e ela teve de se agarrar ao seu pescoço para não cair ao chão.

Durante um instante, ficou imóvel.

— Oh... — retorquiu. — Dói-me muito a cabeça. Devo ter batido com força.

— Assim que chegarmos a minha casa chamaremos um médico — declarou Danny.

— Podes deixar-me no hospital mais próximo — respondeu ela. — Não quero ser um incómodo e, além disso, acho que devem examinar-me a cabeça.

Ele pigarreou.

— Isto é uma ilha privada — explicou. — Não há nenhum hospital.

— Não? Então, como vais conseguir um médico?

Ele sorriu.

— Tratarei disso.

Ela não podia saber que era tão rico que podia chamar um hospital inteiro se quisesse. Então, a sua diversão acabou. Se tivesse tido de escolher entre ficar com a fortuna dos Crosby, que o seu pai juntara, ou recuperar o seu filho e a sua mulher, daria até ao último cêntimo. Levantou-se.

— Fica aqui! — ordenou. — Vou procurar o meu amigo para que me ajude a levar-te para casa.

Ela tinha dores, mas não estava desorientada. Danny tinha a certeza de que entendia o que estava a dizer-lhe.

Ainda que, na verdade, pensou quando descia da rocha e começava a correr pela margem para a sua casa, aquela mulher nem sequer soubesse como se chamava naquele momento.