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Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2006 Harlequin Books S.A.

© 2016 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Muito secretamente, n.º 819 - Julho 2016

Título original: Under Deepest Cover

Publicado originalmente por Silhouette® Books

Publicado em português em 2008

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Desejo e logótipo Harlequin são marcas

registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-8569-1

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo Um

Capítulo Dois

Capítulo Três

Capítulo Quatro

Capítulo Cinco

Capítulo Seis

Capítulo Sete

Capítulo Oito

Capítulo Nove

Capítulo Dez

Capítulo Onze

Capítulo Doze

Se gostou deste livro…

Capítulo Um

 

– Tens que me ajudar a sair daqui! – murmurou Lucy Miller, apertando o telemóvel na mão.

Não era um telemóvel qualquer, mas um codificado que um mensageiro lhe tinha levado a casa há umas semanas. Tinha tocado precisamente quando estava a sair de uma reunião e tinha ido à casa de banho das senhoras para atender a chamada, assegurando-se antes que não houvesse ninguém por perto.

– Acalma-te, Lucy – disse-lhe aquela voz aveludada que já tão bem conhecia.

Inúmeras vezes tinha fantasiado com aquela voz, perguntando-se que aspecto teria o homem a que pertencia, mas nesse momento estava muito assustada para imaginar qualquer outra coisa que não fosse como sair daquela situação sã e salva.

– Não me digas para me acalmar. Não és tu que estás neste banco a tentar agir com normalidade sabendo que alguém te quer matar.

– Ninguém te vai matar.

– Dizes isso porque não viste o homem que me seguia esta manhã. Reconheço um assassino a soldo quando o vejo. Vestia uma gabardina.

– E então? Está a chover.

– «Casanova», não me estás a ouvir! Descobriram-me, alguém esteve no meu apartamento. Ou me tiras daqui, ou apanharei o primeiro avião com destino à América do Sul e levarei todos os dados comigo.

– Não! Espera, Lucy, sê razoável, não...

– Estou a ser razoável. Fiz tudo o que me pediste sem questionar nada, confiei em ti mesmo sem nunca nos termos visto, sem sequer saber o teu nome. Agora és tu quem tem de confiar em mim. Não sou idiota, e se não me tiras daqui, este telefone tão caro acabará no primeiro esgoto que encontrar e nunca mais voltarás a saber de mim.

– Está bem, está bem. Suponho que poderia reunir-me contigo por volta das cinco e meia ou seis. Achas que poderás manter a calma até então, ir para casa e esperar por mim lá?

Lucy respirou profundamente, numa tentativa de se acalmar.

– De acordo, mas se me suceder alguma coisa, promete-me que entrarás em contacto com os meus pais e lhes dirás que os amo, que sempre os amei mesmo que não o tenha expressado muitas vezes.

– Não te sucederá nada, exagerada – respondeu-lhe ele. – Lembra-te, não percas os nervos – reiterou antes de desligar.

Lucy lançou um olhar furibundo ao telefone antes de desligar também. Exagerada? Por acaso acharia que estava paranóica ou algo do género?

Guardou o aparelho na mala, saiu da casa de banho, e dirigiu-se ao escritório com a esperança de não se encontrar com ninguém. No entanto, precisamente quando estava a dobrar uma esquina topou com o director do banco, o senhor Vargov.

– Ah, olá, Lucy. Andava justamente à tua procura.

– Desculpe, estava na casa de banho. O almoço não me caiu muito bem – mentiu.

O senhor Vargov perscrutou-lhe o rosto com o seu olho são. Tinham-lhe dito que tinha perdido o outro num acidente, mas desconhecia os detalhes.

Lucy rogou para que não notasse o nervosismo que a afectava.

– Sem dúvida que não tens bom aspecto – disse-lhe o director, – estás muito pálida.

– Oh, não se preocupe, estou bem – replicou ela, forçando um sorriso.

O senhor Vargov tratava-a sempre com amabilidade, de um modo quase paternal inclusive. Era amigo do seu tio Dennis, e fora ele quem lhe tinha dado aquele emprego num momento da sua vida em que estava desesperada por encontrar um trabalho estável.

Apesar de ser formada em Ciências Económicas, não se tinha visto suficientemente preparada para o que lhe tinham dado porque não tinha experiência, mas parecia que estavam contentes com ela.

De facto, na opinião do senhor Vargov, desempenhava muito bem o seu trabalho, dizia que era muito escrupulosa. No entanto, não levara a sério as suas suspeitas de desvio de fundos. Esse era o motivo pelo que tinha recorrido ao Departamento de Segurança Nacional, e como tinha entrado em contacto com «Casanova».

– Porque não tiras o resto da tarde? – sugeriu o senhor Vargov.

– Oh, não, não posso fazer isso, o senhor disse-me que precisava desses relatórios para...

– Os relatórios podem esperar, vai para casa e descansa, Lucy.

– Obrigado, senhor Vargov, mas a sério que estou bem. Talvez saia um pouco antes se vir que o estômago me continua a incomodar.

E talvez devesse fazê-lo, pensou enquanto o director se afastava pelo corredor. Talvez assim conseguisse distrair o homem que a andava a seguir.

Não lhe importaria nada deixar aquele trabalho. Tinha necessitado de um lugar para se recuperar, para curar as feridas e reencontrar o norte, e o Alliance Truste, um banco de Washington, tinha-lho permitido, mas sentia que tinha chegado o momento de prosseguir o seu caminho.

Ficaria outra hora para descarregar mais informação para a memória USB de alta capacidade que lhe tinham enviado com o telemóvel codificado, e depois ir-se-ia dali para nunca mais voltar.

Casanova tinha-lhe prometido que a levaria para um apartamento seguro, e quando tivessem detido e prendido os implicados naquele turvo assunto, começaria uma nova vida noutra cidade.

Às três e dez já estava pronta para sair. Escondeu a memória USB no sutiã, e após pegar na mala e no guarda-chuva, foi dizer a Peggy Holmes, a secretária do senhor Vargov, que ia para casa porque estava mal do estômago.

– Vai descansada, Lucy – disse-lhe a mulher. – Desde que começaste a trabalhar aqui, só faltaste uma vez ao trabalho, e foi porque te tiveram que fazer uma desvitalização dentária, se não me engano.

Peggy, que já estava há quase vinte anos no banco, já passava dos sessenta, mas tinha uma memória portentosa para os detalhes, e era muito eficiente no seu trabalho.

A ideia de se dirigir sozinha ao parque de estacionamento não se lhe afigurava muito apetecível, além disso pensou que talvez fosse melhor variar a sua rotina diária para distrair quem quer que a estivesse a vigiar. Apanharia o autocarro em vez de voltar de carro.

Quando abandonou o edifício continuava a chover. Era uma chuva miúda mas incessante, portanto abriu o guarda-chuva e aproveitou para, oculta debaixo dele, comprovar que não havia ninguém à vista. Não viu ninguém suspeito, portanto desatou a andar com calma, detendo-se a uns metros da paragem do autocarro e fingindo que olhava para uma montra.

Só quando viu que o transporte público se aproximava é que desatou a correr e entrou nele, precisamente antes de as portas se fecharem. As únicas pessoas a bordo além dela eram uma mãe e os seus dois filhos pequenos, graças a Deus.

Quando desceu na sua paragem, voltou a olhar em todas as direcções. Parecia que não a tinham seguido. Ou isso, ou quem estava a vigiá-la tinha decidido que não havia motivo para maiores preocupações. Tinham entrado na sua casa, mas era impossível que tivessem achado alguma coisa que pudesse delatá-la. Trazia sempre consigo a memória USB.

A casa onde vivia só tinha uma porta, portanto tinha-a preparado especialmente nessa manhã ao sair para poder saber se alguém tinha tentado forçá-la.

No entanto, para seu alívio, o bocado de fio que tinha entalado entre a porta e o umbral permanecia no mesmo lugar. Tirou a chave da mala e entrou, detendo-se um instante para sacudir o guarda-chuva e assegurar-se outra vez que não a tinham seguido.

Há dois anos que tinha alugado aquela casa, e tinha sido o seu tio quem lhe tinha encontrado aquele lugar. Não estava mal, mas era uma casa impessoal num bairro aborrecido, como aborrecida tinha sido a sua vida até há umas semanas. De facto, não se tinha dado ao menor trabalho para tornar a casa mais acolhedora, portanto também não lhe custaria nada dizer-lhe adeus.

Mal tinha fechado e trancado o ferrolho quando uma mão lhe tapou a boca, ao mesmo tempo que o assaltante a agarrava pela cintura, encurralando-a de modo a que não pudesse fugir.

Apesar do pânico que a invadiu, Lucy reagiu com rapidez. Cravou-lhe o guarda-chuva na coxa e o homem emitiu um grunhido.

Lucy aproveitou para se soltar. Pôs-se de cócoras, agarrou-lhe uma perna e puxou-a. O homem caiu ao chão, e Lucy apressou-se a erguer-se, dando meia volta e apontando-lhe à garganta com a ponta do guarda-chuva, como se fosse uma espada.

– Lucy, pára! Sou eu, o «Casanova»! – exclamou o estranho, arrancando-lhe o guarda-chuva e atirando-o para um lado.

Ao fazê-lo, no entanto, não só conseguiu «desarmá-la», mas também fazer-lhe perder o equilíbrio, pelo que Lucy caiu sobre ele, e deu por si a olhar para os olhos mais azuis que alguma vez tinha visto.

– «Casanova»? – repetiu, estupefacta.

Era uma pergunta retórica, sabia que era ele. Soubera-o mal lhe ouvira a voz.

– Santo Deus, estás louca ou quê? Quase me matas.

– Entras em minha casa, atacas-me, defendo-me... e dizes que estou louca?

– Era de esperar que só chegasses mais tarde e eu não sabia quem era – replicou ele. – A propósito, onde aprendeste a defender-te assim?

– Frequentei umas aulas de defesa pessoal há um tempo – respondeu Lucy. – Ainda não me disseste o que estás a fazer aqui. Porque não esperaste que chegasse?

– Porque queria descobrir se estavam realmente a vigiar-te, como disseste.

– Mas... como entraste? A porta não está forçada.

– Entrei pela casa da tua vizinha – respondeu ele com um sorriso malandro, antes de apontar para um enorme buraco na parede da sala.

Lucy olhou-o com os olhos muito abertos.

– Entraste por ali? Meus Deus, deves ter pregado um susto de morte à minha vizinha. E não quero nem pensar o que dirá o meu senhorio quando vir a parede.

– Não estarás aqui para o ver porque vamos embora.

Lucy sentiu-se imensamente aliviada ao ouvir tais palavras.

– Então... quer dizer que acreditas em mim?

Casanova ficou sério.

– Nesta casa há mais microfones ocultos do que na embaixada dos Estados Unidos na Rússia. Não há dúvida que alguém esteve aqui.

– Isso significa que nos estão a escutar neste momento? – perguntou-lhe Lucy baixando a voz.

– Suponho que será um sistema de gravação que se active ao captar ruído de vozes, mas não me parece que estejam à escuta agora. Supõe-se que a esta hora não deverias ter chegado ainda a casa – explicou ele. – Mas não dispomos de muito tempo, temos de sair daqui o mais rápido possível. Portanto, se não te importas, poderias...?

Lucy ficou vermelha como um tomate ao perceber que ainda estava em cima dele. Podia sentir cada um dos ângulos do seu corpo musculoso debaixo dela e, na verdade, a sensação não era nada desagradável. «Meu Deus, Lucy, em que estás a pensar?», repreendeu-se.

Levantou-se tão desajeitadamente pelo constrangimento que, ao fazê-lo, lhe deu sem querer com o joelho nas partes baixas.

Casanova emitiu um gemido abafado de dor.

– És um perigo público, Lucy Miller – resmungou ao levantar-se.

Quando se pôs de pé, Lucy pôde olhá-lo bem, e teve que admitir que nem nas suas fantasias o tinha imaginado tão bonito: alto, físico atlético, cabelo castanho... e, Deus, que olhos!

– Tens três minutos para apanhar o que te fizer falta – disse-lhe. – Só o estritamente necessário – enfatizou: – umas quantas mudas de roupa interior, medicamentos, a escova de dentes... Não te preocupes com a roupa.

Lucy assentiu e correu para o quarto. Tirou umas quantas cuecas, sutiãs e meias da cómoda, a escova de dentes, e o medicamento que tomava para a alergia, e introduziu tudo na mochila.

Ainda lhe restavam dois minutos, portanto tirou a saia, a blusa e as meias, e vestiu uma t-shirt, umas calças de ganga, meias de algodão, e uns ténis.

Não sabia aonde iam, quanto demorariam a chegar, ou se fariam alguma paragem, portanto pelo menos queria estar confortável.

Quando saiu do quarto, Casanova estava à sua espera, impaciente.

– Já não era sem tempo.

– Disseste três minutos, e foi isso que demorei – respondeu ela sem poder reprimir um risinho trocista.

– Estás a gostar disto – disse ele, olhando-a com os olhos semicerrados.

– De certo modo – admitiu Lucy.

Já passara muito tempo desde a última vez que tinha sentido a adrenalina a correr-lhe pelas veias, como nesse momento, e sim, na verdade era tremendamente excitante.

– Mas tenho a certeza que tu também, caso contrário não serias um espia.

Ele assentiu.

– Enfim, vamos – disse-lhe antes de conduzi-la ao buraco na parede.

– Ainda bem que a senhora Pfluger não está em casa – murmurou Lucy, – teria tido um ataque.

– Como tens tanta certeza de que não está?

Dito e feito, a senhora Pfluger, a sua vizinha de oitenta e dois anos, estava sentada na sala de estar a ver televisão.

– Ah, o senhor já está de volta – cumprimentou Casanova com um sorriso.

Mesmo quase não podendo mover-se devido à artrite, a cabeça funcionava-lhe tão bem como se tivesse vinte anos.

– Olá, Lucy.

A jovem olhou-a com surpresa.

– Conhecem-se?

– Bom, até agora não nos conhecíamos, mas este cavalheiro tão simpático explicou-me que corrias perigo porque és perseguida por uns terroristas e que necessitavas da minha ajuda para poderes fugir, portanto... – respondeu a idosa encolhendo os ombros, como se aquilo fosse algo do mais normal.

– Mas a parede... destroçou-lhe a parede... – murmurou Lucy, sobressaltada.

– Oh, não te preocupes com isso, deu-me um maço de notas para a poder arranjar – respondeu-lhe a vizinha antes de virar de novo a cabeça para Casanova. – Enfiei nessa sacola as coisas que me pediu – disse-lhe apontando para um velho saco de compras a seu lado. – É roupa velha que já não uso porque me está pequena.

Casanova deu uma olhadela ao conteúdo do saco e sorriu.

– Excelente, está a ser de grande ajuda, senhora Pfluger – disse-lhe. Depois voltou-se e estendeu o saco a Lucy. – Muda de roupa. Estás prestes a converter-te em Bessy Pfluger.

 

 

Desde que Lucy se pôs em contacto com eles, Bryan Elliott, cujo nome de código era «Casanova», tinha estado a investigá-la para garantir que era de confiança. Tinha descoberto muitas coisas sobre ela, como por exemplo onde se tinha criado, onde tinha estudado, e que empregos tinha tido, e até ao momento tinha-lhes sido de muita ajuda. Era esperta, discreta, e conscienciosa, mas foi ao conhecê-la em pessoa que mais se surpreendeu. Também era valente, e com o treino adequado talvez... Não, não nem sequer devia pensar nisso.

Não podia arrastá-la para o tipo de existência infestada de mentiras que ele levava. Lucy Miller desconhecia a cara feia da vida e... E aquela era provavelmente a roupa mais feia que alguma vez tinha visto, pensou reprimindo um sorrisinho enquanto a via afundar-se numas calças de fato de treino da vizinha.

Em cima da camisola, tinha vestido um impermeável verde horroroso que parecia uma tenda, e tinha colocado na cabeça uma peruca de caracóis brancos.

A senhora Pfluger tinha-lhe oferecido os óculos para completar o disfarce, mas Bryan tinha-lhe dito que não fazia falta, embora tivesse cuidado de não acrescentar que não era necessário porque os óculos de massa de Lucy eram quase tão feios como os seus.

Como podia uma mulher tão jovem usar uns óculos tão pouco estéticos?

– A minha bengala está ali – Lucy foi informada pela idosa, que apontava para um bastão de madeira apoiado num canto.

– É impossível que isto funcione – gemeu Lucy desesperada. – Ninguém acreditaria ao ver-me que tenho oitenta anos.

– Oitenta e dois – corrigiu-a a senhora Pfluger.

– Tenho a certeza que mesmo que esteja alguém a vigiar lá fora, nem repararão em ti – disse Bryan pegando no bastão e estendendo-lho. – Vamos, tenta imitar a forma de caminhar de uma mulher idosa.

Lucy curvou-se e tentou.

– Céus – murmurou a senhora Pfluger. – Por favor, diz-me que não é esse o aspecto que tenho quando ando pela rua.

– Não, claro que não, estava a exagerar – apressou-se a responder Lucy. Aproximou-se da idosa e deu-lhe um abraço. – Não sabe como lhe agradeço que me esteja a ajudar, senhora Pfluger. Quero dizer que... nem sequer conhece este homem.

– Mostrou-me o seu distintivo – replicou a idosa. Obviamente nem lhe tinha passado pela cabeça que pudesse ser falso. – E além disso, parece um bom rapaz, tenho a certeza que cuidará bem de ti.

– Espero que sim – murmurou Lucy lançando um olhar significativo a Bryan. – Vamos?

Bryan agradeceu à sua vizinha e saíram da casa.

– Mantém a cabeça baixa – disse num sussurro a Lucy, enquanto caminhavam rua abaixo. – Assim. Estás a sair-te estupendamente. Se não soubesse a verdade, acharia que és uma avozinha.

Quando chegaram ao lugar onde tinha estacionado o carro no qual tinha ido até ali, abriu a porta a Lucy, fingiu ajudá-la a entrar e contornou-o para se sentar ao volante.

Pôs o veículo em andamento e afastaram-se. Olhou pelo retrovisor, mas não parecia que ninguém os estivesse a seguir, e por fim relaxou-se um pouco.

Minutos depois entravam no estacionamento do centro comercial de onde tinha levado o carro, que deixou estacionado perto de onde o tinha encontrado.

– Porque parámos aqui? – perguntou-lhe Lucy.

– Porque vamos mudar de carro – respondeu ele desligando o motor e tirando a chave multiusos da ignição.

– O quê? – inquiriu Lucy. – Oh, meu Deus, não me digas que roubaste este carro?

– Roubado não, só o levei emprestado. A dona está lá dentro às compras e nunca saberá.

– Dá um pouco de medo... que existam intrigas como esta, quero dizer, que os agentes secretos do governo andem por aí a roubar carros.

– Os agentes secretos do governo fazem coisas muito piores, receio bem – murmurou ele quando saíram do veículo.

Ainda não queria dizer nada a Lucy, mas tinha um mau pressentimento.

Conduziu-a ao carro no qual tinha chegado ali, um Jaguar prateado, o seu veículo particular. Não tinha querido arriscar-se a que o identificassem, e por isso tinha feito a mudança.

– Caramba, este é melhor do que o Mercedes de antes – comentou Lucy quando estavam dentro do veículo. – Também o estás a levar emprestado?

– Não, este carro é meu.

Lucy deixou escapar um longo assobio.

– Não imaginava que ser espia fosse tão bem pago para se poder ter um Jaguar.

– E não é. Este trabalho não é a minha única fonte de rendimento – respondeu Bryan.

Ele próprio nunca teria imaginado que a sua fachada, o negócio que tinha estabelecido para ocultar a sua verdadeira profissão à família e amigos, fosse resultar tão lucrativo.

– Já podes desfazer-te do disfarce, estamos a salvo.

– Graças a Deus – murmurou Lucy tirando a peruca e deixando o seu verdadeiro cabelo, uma espessa mata castanha, esparramar-se sobre os ombros.

Para Bryan, o cabelo de uma mulher nunca lhe tinha parecido especialmente excitante, mas havia algo de muito sensual naquele cabelo comprido.

Lucy tirou o impermeável, atirou-o para o banco traseiro, e praguejou entre dentes.

– Deixei as calças de ganga em casa da minha vizinha.

– Não, eu guardei-as... – começou Bryan antes de se calar subitamente.

Não, não as tinha guardado em lugar nenhum, tinha ficado tão embevecido a olhar para Lucy a tirar as calças para vestir as de fato de treino da idosa, que se tinha esquecido de guardá-las na mochila da jovem. Claro que nenhum homem com sangue nas veias teria desviado o olhar. Tinha umas pernas incríveis e...

– Não te preocupes, conseguir-te-emos roupa.

Não era o momento de pensar nas pernas de Lucy. Tinham um problema, e muito sério. Tinha achado que aquela história de que a estavam a vigiar era um exagero da jovem, mas os microfones ocultos na casa não eram produto de sua imaginação.

De facto, depois de examiná-los, tinha reduzido consideravelmente a lista de possíveis suspeitos. Aqueles microfones eram tecnologia de ponta, comprada na Rússia. Eram tão modernos que unicamente a sua agência tinha acesso a eles... à parte dos russos, obviamente, mas duvidava que os russos estivessem implicados naquilo.

Não, alguém da sua própria organização tinha-o traído, e isso significava que a sua vida e a de Lucy corriam perigo, a menos que identificasse o traidor e o neutralizasse o mais rapidamente possível.